30 de abril de 1994. Eu também me lembro daquele dia. Fui pro colégio p. da vida, porque tinha que fazer simulado de vestibular. E, claro, eu queria ver a classificação do GP de San Marino na TV. Naquela época, meu caro Henrique, as corridas de F1 eram escassas, e só tinhamos a transmissão das classificações e as corridas para assistir. 32 oportunidades de ver F1 ao vivo no ano, muito diferente das 95 chances que se tem hoje. Minha irmã foi me buscar no colégio pouco antes do meio-dia, e eu, claro, doido pra saber o resultado, perguntei logo que entrei no carro:
- E aí, quem fez a pole?
- Senna, mas morreu um cara...
- Como assim?
- Um cara bateu, e acabou morrendo, tá uma baita confusão.
- Quem?
- Um austríaco, não sei o nome...
- BERGER?
- Não, esse eu conheço!!! Outro...
- Putz, então foi o Ratzemberger, da Simtek.
- Esse mesmo.
Que m. Naquela época, eu tinha o péssimo hábito de invadir os boxes durante o GP Brasil, que em 94, era abertura do campeonato. E depois dos treinos de sexta, como de praxe, pulei a cerca do setor G, e fui subindo em direção ao paddock. Não havia visita ao pit lane naqueles tempos, mas mesmo assim eu sabia que de vez em quando os fiscais corriam os boxes peneirando os intrusos. Eles sempre começavam no box 1 e iam descendo até o 23, empurrando o pessoal para a passarela sobre o S do Senna. A receita era tirar fotos dos carros de ponta, e ir fugindo dessa peneira, até chegar no box da Minardi. Chegando lá, na cara de pau, era pedir para atravessar até o paddock (eles sempre ajudavam, até me esconderam uma vez) e assim a frente de fiscais passava por mim. Pronto, era só voltar pro começo do pit lane, e esperar uma outra onda de fiscais.
Mas num desses dribles, acabei caindo atrás dos boxes da Simtek. E lá estava Roland dando entrevistas, feliz da vida. Meu inglês era muito fraco, mas deu pra entender algumas coisas: que apesar de ter ido mal no treino, ele estava feliz da vida, que o seu objetivo era simplesmente guiar um F1 num Grande Prêmio. E que ele estava muito próximo de realizar o sonho. E, apesar do meu inglês, deu pra entender que ele tinha se esforçado muito para chegar lá, tinha vendido tudo, inclusive o carro, para conseguir verba para disputar a F3000, e conseguir dar o salto pra F1. A excelente entrevista da revista Warm Up nos leva a entender que as coisas foram um pouco menos difíceis, mas o esforço para chegar na F1 foi real, e foi muito duro.
Em 1994, as máquinas fotográficas eram com filmes de rolo. E as minhas fotos estavam acabando. Por isso, não tirei foto dele. Mas o que ficou foi um autógrafo num caderninho, e a lembrança de um cara que estava feliz simplesmente por estar lá. Ele sabia que não seria campeão do mundo. Sabia que não venceria provas, não iria marcar a melhor volta, talvez marcasse algum ponto. Mas isso não interessava, ele estava feliz por andar (ou se arrastar) num F1, e a sua alegria era contagiante.
Mesmo andando no fundo do pelotão, simpatizei com o cara, e com a equipe vira-lata que tinha patrocínio da MTV. Pena que foi por apenas algumas semanas.
As investigações que se seguiram após o acidente, foram um pouco abafadas porque o interesse maior era saber o que havia acontecido no Williams número 2. O Team Principal da Simtek era o Nick Wirth. Ele já havia se envolvido no projeto fracassado da Andrea Moda, e as fofocas da época diziam que o carro da Simtek não havia sido aprovado no crash test da FIA. O time só passou na inspeção porque Wirth era um apadrinhado de alguém na Federação. Consipirações à parte, Nick ainda trabalhou na Benetton, passou um tempo sumido e voltou no projeto da Virgin, naquele carro que foi desenvolvido 100% nas simulações de computador. Como sabemos, ele não teve muito sucesso, mas ainda mantém sua empresa, forte na parte de simuladores.
Esse aqui é o carro de 1995, mas é o modelo que eu tenho de papel de um Simtek.
Sim, isso é de papel.
A investigação concluiu que a causa provável foi a rodada na curva Tosa, na volta anterior, que rachou um suporte da asa dianteira. Quando essa asa foi submetida a alta carga, no final da enorme reta curva de Ímola, quebrou. Ratzemberger bateu no muro a 300 km/h, e morreu imediatamente.
O curioso daquele final de semana é que Senna foi um dos que mais se preocuparam com a morte dele (existe aquela história da bandeira da Áustria no bolso do macacão). E foi justamente Ayrton quem tornou a morte do Roland um fato não tão lembrado no automobilismo. Mas eu, pelo menos, lembro bastante do dia 30, porque aquele cara me lembra que dedicação e trabalho, fazendo as coisas com alegria, dão resultado.
que relato bacana! engraçado que imaginei tudo como se o post fosse do Rafa (acho que graças ao "... meu caro Henrique..." lá no começo). Depois tive que refazer as imagens na cabeça
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