Bom, o passeio começa agradável, passeando pela região. O clima estava péssimo, cerca de 5 graus, apesar de ser primavera. Chegamos um pouco cedo, e pra fazer hora, dei uma passeada pelo circuito antigo. Essa aqui é a antiga Les Combes, quando era pra esquerda, e na área de escape tem um leve precipício. Na época, não havia o guard-rail, e os caras eram realmente corajosos de fazer os 1,2 km da reta Kemmel, e se arriscar a entrar nessa curva aí:
Dá pra reparar na foto que a pista estava úmida, daquele jeito que Spa é. Os caras não eram muito bons da cabeça, não.
Mas o tour pelo autódromo começa contando a história da pista. A cidade de Spa, lá por 1890, era um lugar turístico, famoso pelas termas, e badalado pelos playboys da época. Mais ou menos como Mônaco é hoje. Alguns desses playboys montaram uma corrida pela região em 1904, mas não era disputada naquele famoso trecho entre Spa e Francorchamps. O autódromo no seu local atual seria inaugurado em 1921, mas a prova inaugural foi cancelada porque só tinha 1 inscrito...
A largada na pista antiga era feita na descida, depois da La Source, exatamente na frente da torre Uniroyal. A nossa excursão entra na pista numa passagem ao lado da torre:
Agora, a vista ao lado da torre. Os boxes foram todos reformados nos anos 80, e com a passagem dos anos foi mantido no padrão FIA. Hoje esses boxes ainda são usados nas corridas de suporte.
Em seguida, subimos em direção aos boxes novos, onde a F1 ocupa este final de semana. Essa é a visão do novo complexo, visto dos boxes antigos:
Uma curiosidade da foto acima: a casa de pedra (e o carro em frente) pertencem ao único morador do autódromo. Existe alguém que mora lá, e é claro, é funcionário do autódromo. É o enfermeiro de plantão. Imagina a dor de cabeça do cara se quiser sair de casa para comer uma pizza num sábado de F1...
O novo complexo foi erguido para atender as exigências de Bernie Ecclestone para a volta do GP da Bélgica, em 2006. Aliás, o guia, também funcionário do autódromo, contou sobre as artimanhas de Bernie para tirar mais dinheiro dos promotores. Nada além do que já conhecemos, mas o apetite do baixinho é conhecido (e odiado) por todos os promotores.
Eu conhecia os boxes antigos. E sabia da pressão do Bernie para realocar os boxes de Interlagos na época. Mas eu achava que era jogo de cena, porque se a F1 corria num lugar com os boxes como os de Spa, Interlagos não era o pior de todos.
Agora é diferente, o GP Brasil está ficando sem pretextos. Os boxes construídos em 2006 podem não ser suntuosos como os da Arábia, mas são enormes:
OK, a última foto estava ruim, mas com o frio que estava, mereço um desconto. Apesar de parecerem pequenos por fora, são gigantescos por dentro: banheiros particulares, e são tão altos que cada um conta com um escritório climatizado, num mezanino. São do tamanho que a F1 moderna pode ocupar. Assim como o padrão dos novos boxes de Silverstone, podemos esperar uma obra grande na reta oposta de Interlagos no ano que vem.
Abaixo dos boxes, 3 andares de estacionamentos, aproveitando o relevo da região. Cabem os motorhomes, e mais um monte de carros, que ficam próximos ao pit lane. Nada de estacionar no terrão no meio da curva do Sol, e subir uma rampa ou escada pra chegar no paddock...
Acima dos boxes, as cabines de rádio, a sala de imprensa, e a sala de coletivas ao lado:
E lá, nas paredes da sala, alguns pôsteres com a história do circuito. É lá também que são feitos os briefings antes das corridas. E tem também mapas do circuito. Notem uma coisa diferente neste mapa, que vai ser uma surpresa para muita gente:
Repararam alguma coisa "diferente do padrão"? Vai uma dica: não falta um nome aí embaixo?
Realmente é difícil de perceber. Mas o que me surpreendeu é que a curva NÃO SE CHAMA EAU ROUGE. Eau Rouge é só o nome do rio água vermelha que passa abaixo da curva. O nome oficial dela é Raidillon. E ela não faz parte do circuito original, construído em 1921. Foi feita anos depois. E Raidillon significa "subida íngreme". Eles sabem que o pessoal chama de Eau Rouge a curva, "algum desentendimento no passado" mas preferem chamá-la de Raidillon. E, pra quem não conhece, a subida é íngreme mesmo:
Muita foto, então um pouco de história. O guia deu um lado interessante sobre o traçado original, de 15 km ser tão perigoso. A pista (como todo o automobilismo) começou realmente a ser popular depois da 2a Guerra Mundial. E porque um perigo iminente, como aquela Les Combes da primeira foto, era aceito, e de uma certa forma, desejado? Porque a Raidillon foi feita, tornando o circuito mais seletivo, e muito mais perigoso?
Porque na época, no pós guerra, a morte prematura era encarada como algo "normal". Todos europeus foram afetados pelas guerras, perderam parentes ou conhecidos, seja no front ou em bombardeios, ou de fome, mesmo. Eram tempos cruéis, e brutos. Eu não vivi aqueles tempos, mas isso me fez pensar o porque daqueles caras aceitarem andar tão rápido naquelas condições, e entender um pouco a lógica da época.
O automobilismo só foi pensar em segurança na geração seguinte. Em 1969, houve a famosa greve liderada por Jackie Stewart, que culminou no cancelamento do GP.
O simpático guia é o que está no pódio. E atrás daquele povo todo, a torre de controle, sobre o box 1:
Faz tempo que eu não visito a torre de Interlagos, mas acho difícil que ela tenha um sistema de monitoramento permanente como essas pistas na Europa tem. Não é questão de falar que o que é gringo é melhor, e sim de dizer que uma estrutura dessas é necessária para segurança de todos os que estão nos carros na pista, e prestando atendimento fora dela. Mesmo considerando uma geografia favorável que permite visualização de quase toda pista, este é um investimento relativamente baixo para os benefícios que pode trazer. De qualquer forma, com os novos boxes, isso deve ser feito em São Paulo.
Falando em TV, outra coisa legal que o guia falou: Bernie vende as transmissões por pacotes: Cada GP tem mais de 180 câmeras montadas. Mas você pode comprar, por exemplo, o pacote básico, com 11 câmeras que cobrem toda a pista, mais 1 onboard, mais uma câmera nos boxes. Mas esse pacote não te dá direito a narrador nem repórter no autódromo. Você pode optar por comprar um pacote melhor, com 40 câmeras, todas onboard, narrador, comentarista, repórter e câmera no autódromo.
A nossa querida Globo deve comprar um pacote intermediário, e o pacote top de linha deve ser o que as emissoras inglesas compram, obviamente a um custo muito superior. A Globo lucra horrores com a transmissão da F1, mas também deve gastar outra indecência para realizar o GP Brasil, então precisa tampar o buraco de alguma forma. Isso ajuda a entender um pouco o produto que nos oferecem aqui.
E na parte final da visita, acima da sala de controle, o restaurante. A vista é bem legal:
Dá pra ver a subida da Raidillon, a descida para a Double Gauche, e a aproximação para a chegada. E esse é o lugar que dá a melhor visão do circuito. O que me lembra mais uma história. Prometo ser a última, que isso aqui tá grande demais: nos primeiros anos, o sistema de monitoramento da pista era por telefone. Existiam postos de controle que eram cabines telefônicas espalhadas pela pista, ligadas à torre Uniroyal.
Não havia transmissão ao vivo, mas tinha um narrador no sistema de som da pista. E o narrador ficava louco porque as informações chegavam desencontradas. Conforme espectadores que andavam pela pista informavam os operadores das cabines telefônicas, era passado para torre e pelo narrador. E muitas vezes eles estavam errados. Então, era comum o narrador anunciar no sistema de som que o Vanwall número 3 havia abandonado a prova, quando o próprio Vanwall estava descendo a reta de largada na sua frente!
Ou então, as informações chegavam picadas para todos, inclusive as equipes, conforme os espectadores fossem levando e trazendo as informações: "Houve um acidente na Malmedy" e minutos depois: "Foi uma Bugatti". "Foi Loius Chiron". Depois que família e equipe tivessem passado por um ataque cardíaco, vinha a correção: "Na verdade o acidente em Malmedy foi com Nuvolari, de Maseratti..." Realmente, tempos difíceis aqueles.
O final do tour previa uma volta na pista de ônibus, mas a pista estava alugada para um track day. e ficamos por ali mesmo, nos boxes, e poderíamos fazer o que quiséssemos. Mas como estava muito frio, a melhor coisa a fazer era entrar no carro e voltar pro quentinho do hotel...
A foto acima é a visão de uma cabine de transimissão. Obviamente, o narrador só consegue trabalhar com o monitor da TV na frente, porque na corrida não vê nada, mesmo.
Agora, só pra aproveitar, vou dar só um pitaquinho da classificação de hoje:
O que deu na cabeça da Ferrari de desistir do Q3? Foram com pouco combustível? Acharam que estava garantido? Ficaram com medo de bater? Estavam com vontade de ir ao banheiro? Abrir mão daquela última volta é imperdoável. Ainda mais pro Alonso. Numa corrida dessas, prometendo ser caótica com a chuva intermitente,ele era um provável vencedor. Largando atrás, a chance de estragar a corrida da La Source é muito grande. E parabéns ao Van der Garde!! E parabéns pro CT!!
Antes que comece a polêmica com o nome da curva, eu estou pouco me f. de como ela é chamada. Pode ser Água Vermelha, Água Roxa, Subida Íngreme, Ladeira do Meu Pai do Céu, o que for. A curva é demais, e deixem o povo chamar do jeito que quiser!
ResponderExcluirEu entendia a descida como Eau Rouge e a pirambeira (que não da pra ter ideia pelas fotos) de raidillon... bom, mas isso nao importa, o que importa é ter tido a sensação de que o corsinha nao ia subir o barranco!!!
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