Não é nenhuma novidade que mais downforce e menos arrasto faz um carro de corrida andar mais rápido. A maneira como estes parâmetros são analisados durante o desenvolvimento aerodinâmico do carro, no entanto, não é direta assim e objetivo deste post é explicar um pouco sobre como isto funciona.
Dentre todas as aletas, carenagem, difusor, etc, praticamente os únicos elementos que permitem aos engenheiros de pista ajustar a configuração aerodinâmica do carro são as asas dianteiras e traseiras, todos os outros são elementos fixos. Falo aqui de downforce/arrasto, porque os engenheiros têm sim a opção de mudar níveis de arrefecimento dos freios e radiadores ao longo de um final de semana, mas isso é um fator pouco relevante no assunto deste post.
A asa dianteira tem como principal objetivo gerar downforce sem “sujar” muito o escoamento que vai para a traseira. E por este motivo, a asa dianteira trabalha muito abaixo do seu limite e é altamente eficiente. Por eficiência, me refiro ao fato de que um pequeno incremento no ângulo de ataque gera um grande incremento de downforce com um mínimo incremento de arrasto.
A asa traseira, por sua vez, trabalha no limite, muito próximo de estolar. Assim, ela tem menor eficiência e um pequeno incremento do ângulo de ataque gera um grande incremento de downforce com um significativo incremento de arrasto.
Tendo em vista as características acima, o que acontece na preparação e durante o final de semana de um GP (do ponto de vista de aerodinâmica) é o seguinte: a equipe define antecipadamente através de simulações ou experiências de anos anteriores qual será o target de velocidade máxima do carro. Com isso eles definem mapas do motor e configuração inicial do câmbio.
Nos treinos livres de sexta os carros saem para as voltas de instalação e verificam como está a situação na pista em relação ao que foi planejado. Se o carro está mais veloz em reta do que o planejado, a equipe aumenta o ângulo da asa traseira e com isso aumenta o arrasto, mas também aumenta bastante a quantidade de downforce. Porém como o downforce foi adicionado apenas na traseira, algum downforce tem também que ser adicionado na dianteira para que o carro seja “dirigível” nas curvas. Eles vão então e ajustam a asa dianteira para corrigir o balanço (e esta resulta em um acréscimo mínimo de arrasto).
Estes dois processos de correção do nível de arrasto e balanço aerodinâmico são feijão com arroz no processo de ajuste em pista e no desenvolvimento aerodinâmico do carro. No caso de medidas em túnel ou CFD, o valor bruto de downforce tem que ser sempre corrigido usando estes dois processos para que se tenha a confirmação de que o resultado é bom ou ruim.
Tipicamente o departamento de aerodinâmica trabalha com baselines durante o desenvolvimento, que são configurações de referência. Para um dado baseline, plota-se os valores de downforce total em função do balanço aerodinâmico (rezão entre downforce na dianteira e na traseira) através da variação da asa dianteira e downforce total em função do arrasto total através da variação da asa traseira.
Ao analisar-se uma variação, por exemplo um novo difusor, uma situação interessante pode acontecer quando o valor medido significa uma redução de downforce. Porém quando o valor (vermelho) é colocado na curva de arrasto e comparado com o baseline (azul), nota-se que o arrasto também é menor e que como agora o arrasto do carro está abaixo do target (como no exemplo em pista que coloquei acima) o ângulo da asa traseira pode ser aumentado, resultando em um nível de downforce acima do que o baseline.
Este difusor, portanto, representa uma redução de downforce mas permite um ajuste que gera mais downforce do que o baseline. O próximo passo é o rebalanceamento: como o ganho é essencialmente na traseira, o ângulo da asa dianteira tem de ser aumentado para que o target de balanço seja atingido e um processo semelhante (azul-vermelho-verde) acontece novamente, o que significa ainda mais downforce no conjunto final!
Assim, o objetivo é sim sempre aumentar o downforce porém existem situações onde uma redução de downforce pode resultar em aumento do downforce corrigido e existem situações opostas em que um aumento do downforce medido no túnel ou em CFD acaba requerendo reduções de arrasto e balanço e o resultado final é ruim!
Portanto, uma asa dianteira muito eficiente para as correções e incrementos de downforce na traseira são sempre muito bem vindos! Quando à asa dianteira eficiente, a posição da câmera dianteira (obrigatória) tem uma influência importante: quando ela é posicionada próximo da asa ela tende a aumentar a quantidade de downforce gerada pela asa e pode ser importante se a equipe precisar rebalancear ganhos na traseira, porém ela resulta também em uma perda de eficiência da asa. O fato da Red Bull ter sua câmera no bico significa que eles não estão usando esta para gerar downforce e que estão sendo capazes de rebalancear seu carro de maneira mais eficiente, provavelmente relacionado de alguma forma à flexibilidade da asa.
Reparem na Turquia e Barcelona que updates nos difusores quase sempre vêm acompanhados de updates na dianteira para rebalancear os ganhos, e reparem especialmente na câmera dianteira de uma equipe verde e amarela em Barcelona, quando um novo difusor será introduzido.
CT, valeu por elevar novamente o nivel do blog... agora, faltou a foto da camera no nariz no carro.
ResponderExcluirOutra coisa, essa coisa da asa da RedBull ta estranha, pois a FIA mudou o teste e agora põe, além de 100kg em cada ponta de asa, 100kg numa ponta e nada da outra, visando medir a torção do nariz, e nada, ou seja a RedBull continua passando no teste
Esse post deixa bem claro como um carro de F-1 tem que ser pensado como uma coisa única. Não adianta ter um motorzão, uma baita suspensão e apêndices aerodinâmicos hiper otimizados se a coisa não funcionar direito quando juntar tudo.
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