PRÓLOGOQue coisa, um post que pensei em escrever neste blog há muito tempo iria me tornar profeta, mas por preguiça não escrevi, e perdi a chance. Ainda não vi os comentários aqui, não sei o que vocês pensam, mas vou desembuchar. Pra mim a coisa de ontem foi normal.
Eu ia escrever semanas atrás que se a Ferrari já teria colocado Alonso ao status de primeiro piloto no Canadá. Na época, a distância de pontos, e principalmente, a qualidade da pilotagem, tornavam óbvia a escolha. Talvez, e aqui estou especulando, a renovação de Massa estivesse condicionada a esta posição de segundo piloto. Isso não sei. Mas o fato é que se alguém na Ferrari tinha alguma (mínima, é verdade) chance de disputar o campeonato com este carro manco, é Fernando Alonso.
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Largada (Mark Thompson - Getty Images)
ERA UMA VEZ...
Então chegamos a Hockemheim. Estranhamente, as Ferrari são bons carros, o pneu ultramacio funciona para Felipe, e melhor para Alonso. Velocidade por velocidade, Alonso empatou com Vettel na pole. Então eram rápidos. Na corrida, Alonso parou antes, e ele sabidamente desgasta menos pneu. Massa ia fazer uma volta a mais, com o pneu “na lona”. Isto estava programado. Ou seja, a escolha de piloto favorecido já havia sido feita, antes da largada.
“Ah, mas isso é porque escolheram a estratégia baseados no grid. Ninguém poderia imaginar que o Felipe ia cruzar a primeira volta na frente.” OK, então poderiam ter invertido a ordem de parada. Mas não inverteram, e muito menos “erraram” na troca de Massa para ele voltar atrás do Alonso. Ainda não dava. A corrida ainda estava no começo. Segurar a segunda Ferrari no box poderia significar que ele ia voltar atrás de Vettel, perdendo a dobradinha. E pior, se Alonso tem algum problema, a Ferrari ia dar a corrida de graça pra Red Bull.
Depois a corrida acomodou, os parâmetros de consumo de pneu, freio, as temperaturas estavam em ordem, a corrida controlada. Aí veio a ordem. E o resto é isso mesmo.
NO MEIO DISSO TUDO....
Agora, vou comentar uma coisa que eu não vi em lugar nenhum. É o seguinte, o engenheiro de cada piloto funciona como se fosse um navegador de piloto de rally. É o engenheiro que verifica o tráfego, marca o ritmo, verifica os parâmetros do motor, igual o navegador. Então, quando um piloto ganha, o engenheiro ganha junto. Assim como no rally, se forma uma relação de confiança. E é comum um engenheiro subir de categoria junto com um piloto, até chegar na F1.
Felipe Massa e Rob Smedley sabiam da escolha por Alonso. Mas não esperavam a ordem. Melhor, esperavam, mas tinham a esperança de que ela não viria. O que eu entendi na voz do engenheiro falando para o piloto, foi uma revolta. Falar alto e claro, daquela forma, sabendo que a transmissão seria divulgada, foi o seu ato de rebeldia. Foi Rob Smedley quem apostou em Massa, na recuperação do acidente. Foi ele quem trabalhou duramente com Felipe para aprenderem juntos como aquecer os pneus neste carro. E estava dando certo, finalmente. A vitória estava sendo tirada dele também. Foi Smedley quem jogou no ventilador. A melancolia do “sorry” depois da manobra reforça esta minha impressão.
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Rob Smedley e Felipe Massa (Não achei o autor da foto... Sorry...)
FINALMENTES
Depois da quadriculada, aí, sim, um show de horror. A desfaçatez de Fernando Alonso ao perguntar sobre o problema de câmbio da outra Ferrari passa os limites do cinismo. Aliás, o “ridículo” durante a corrida também é uma marca da escolha da equipe. Como ele está me fechando a porta, sabendo que sou eu que vou ganhar a corrida? Por mim, a carta já estava marcada ali. E se a estratégia da Ferrari era aquela, talvez fosse a melhor oportunidade para a troca de posições, mas Felipe não queria sair de Hockemheim com a cara de derrotado.
Voltando a Alonso, o rádio, mais a alegria comemorada no pódio, isso sim é ridículo. É uma tentativa tosca de repetir o “eu não sabia” de Cingapura. Ah, cara, me chama de burro, mas não faz isso comigo, Alonsito...
Massa não tinha o que dizer. Fez o que fez, todo mundo viu. A cara de bravo era por causa do espírito combativo, que havia lhe sido capado. Não lhe deram a chance de brigar pela vitória.
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Perdedor e perdedor no pódio. (Andrew Hone - Getty Images)
E SE...
Escrevi um tempo atrás que às vezes, ÀS VEZES, é melhor deixar passar e seguir a sua corrida. Ontem parece ter sido o caso. SE Massa brigasse com Alonso, ou um acidente ia acabar com a dobradinha, ou o traçado defensivo de Massa iria permitir a aproximação de Vettel. Sebastian não atacou porque não viu a oportunidade, mas se as Ferrari ficassem duelando nesta pista apertada e sinuosa, usando todo um leque de manobras para se defender, iam se atrasar. Vettel viria pra cima, e chegaria na dupla.
Além disso, o pneu duro andando no sujo, e andando no vácuo, pela proximidade, iria formar o graining. Alonso seria uma presa fácil pra Red Bull, e a dobradinha ia pro vinagre. Não vi os tempos de volta, mas minhas contas apontam para algo assim.
MORAL DA HISTÓRIA
Não vai dar em nada. A regra é mal escrita, muito subjetivo, o Conselho vai se reunir em setembro ou outubro, até lá o campeonato já está praticamente decidido e não vai adiantar mudar nada. Talvez até a multa seja suspensa. Mesmo que seja mantida, com certeza os pontos que a Ferrari ganhou nesta corrida dão muito mais dinheiro, na hora de dividir o bolo no final do ano.
Massa saiu manchado? Saiu, muito mais no Brasil, virou o novo Barrichello. No resto do mundo, foi parte de uma armação. Ainda é cedo pra prever as conseqüências, mas ele não tinha escolha. Era isso ou um corte no contrato do ano que vem, ou um 2011 infernal. Todo mundo lembra que ele já fez isso por Kimi, com a promessa de disputar o título no ano seguinte, coisa que se realizou. Pode ser que ele volte com tudo ano que vem.
Em Interlagos 2007 ninguém falou nada do "erro" no pit stop. E o que tem de diferente lá e agora? Pode ser que estes 7 pontos façam falta no final do ano. Se Alonso vencer Vettel por 5 pontos em Abu Dhabi, a Ferrari vai dar risada da nossa ignorância. Sinceramente, acho que o carro na Hungria volta a andar atrás, e em Interlagos a Ferrari já estará fora do título. Mas quero errar.
Rubinho pela primeira vez foi discreto, não alfinetou Schumacher, nem a Ferrari, nenhuma declaração maldada ou impensada (pelo menos não vi até agora). Parece que finalmente aprendeu que em boca fechada não entra mosquito. Ponto para ele. Michael falou uma verdade: Só não poderia ser tão explícito. Mas aí a Ferrari não contava com a revolta de Smedley, de escancarar tudo daquela forma.
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Corre, que o bicho papão Vettel vem aí! (Andrew Hone - Getty Images)
EPÍLOGO
Alonso é um hipócrita. E faz a sobrancelha, negando a nossa característica espanhola. Mas todo campeão tem o seu lado de sujo, joga com todas as cartas escondidas na manga que tem. Não devia, mas é assim. Felipe tem que se explicar para a esposa e filhos, não pra mim, muito menos pelo Brasil “que acorda cedo no domingo pra torcer pra ele”.
A Fórmula 1 se mancha, mas daqui a alguns anos vai virar só mais um episódio, como foi Cingapura ou Áustria. O esporte puro se foi faz tempo. Os tempos são outros, nesta época do politicamente correto. Acreditar romanticamente que o seu companheiro de equipe é seu primeiro inimigo já foi. Hoje, acima do seu inimigo, tem o seu patrão de contrato com multas na mão, a coisa é diferente.
Eu acho normal o Alexandre Vinokourov se matar nas montanhas para dar a vitória no Tour para o Alberto Contador. O ciclismo há muito tempo é assim. Ver Felipe abrir para Fernando me soa estranho, eu não gosto, mas é assim que é agora. Então, quem goste que continue. Eu vou continuar, como sempre só pra dentro da linha vermelha. O que eu gosto são pessoas tirando o máximo de máquinas e de si mesmas, procurando vencer barreiras impossíveis. Pilotos fazendo curvas de lado, corrigindo tangências de uma forma incrível, uma obra de arte, em busca de milésimos.
A superação ainda existe na F1, e por isso vou continuar apreciando as corridas. Só me incomoda que a arte não possa ser executada a pleno.